3 de julho de 2007

Os independentes, que maçada!

A democracia é, por definição, o sistema politico em que o poder reside nos cidadãos, como alternativa aos sistemas ditatoriais, em que o poder reside numa só ou num reduzido número de pessoas. Para governar um país ou uma autarquia, não é possível consultar todos os cidadãos dessa área para todas as decisões a tomar, sendo o referendo apenas para questões de grande importância. Assim, torna-se necessário que os cidadãos deleguem o poder num número restrito dos seus pares que, dentro de certo limite de funções e por um determinado período de tempo, irão exercer esse poder.
Naturalmente, se o poder é dos cidadãos, a primeira liberdade que devem ter é a de decidirem livremente em quem o delegam para, em seu nome, governarem, ou mesmo de se candidatarem, se for esse o seu desejo. (A necessidade dum certo número de eleitores apoiarem a candidatura justifica-se para evitar um elevadíssimo número de candidaturas em quem quase ninguém votaria). Em Portugal, as únicas eleições que satisfazem a estas condições são as que se destinam a eleger o Presidente da República. E o número de apoiantes exigido, entre cerca de 0,1% e 0,2% de apoiantes (para cerca de 8 milhões de eleitores, o Artigo 124º da Constituição determina que as candidaturas sejam “propostas por um mínimo de 7 500 e um máximo de 15 000 cidadãos eleitores”), parece perfeitamente adequado.
Quando não há eleições ou estas sofrem limitações, seja por fraude na admissão ou na contagem dos votos, ou por imposição de os cidadãos só poderem votar nos nomes que um ou alguns senhores indicam, estamos em ditadura. Se são os chefes de partidos que têm o “direito” de dizerem aos cidadãos em quem é que eles têm licença de votar, temos uma ditadura partidocrática, para a qual cunhei o nome de “partidismo”, para estar de acordo com os outros “ismos” (socialismo, capitalismo, anarquismo, nazismo, comunismo, fascismo, etc.).
Em Portugal, para as autarquias, abriu-se há poucos anos “uma pequena janela democrática”(1) e passou a ser possível, também (devia ser exclusivamente), haver candidaturas independentes, ou seja, não decididas pelos chefes dos partidos. Como já demonstrei – com os factos – em vários casos onde isso sucedeu, as candidaturas independentes bateram estrondosamente os candidatos escolhidos ditatorialmente pelos chefes dos partidos(2, 3, 4). E mostraram a falácia dos partidocratas que declaram que “não há democracia sem partidos” e que, “sem apoio dum partido não é possível ganhar eleições”. É claro que a perda desse monopólio dos partidos – que continua a existir nas eleições para a Assembleia da República, as mais importantes de todas – é um dos grandes desgostos dos partidocratas. E tem-se visto o seu desespero, bem evidente em vários casos. Um jornal até escreveu que o anúncio da candidatura de Helena Roseta “baralhava” as eleições para a Câmara Municipal de Lisboa.
Só teremos democracia quando todas as eleições forem de independentes, que podem ser apoiados por quem o desejar, incluindo os partidos. O que não pode haver, numa democracia, é partidos como órgãos de poder e ainda por cima órgãos de poder ditatorial(5). O actual sistema, com mais uma aberração que é os círculos, além de serem plurinominais, coincidirem com os distritos, o que dá um número muito variável de eleitos por cada um, indo dos casos de apenas dois ou três deputados até alguns que elegem dezenas de deputados. Nestes últimos e com as listas fixas, existem os lugares “elegíveis” à partida, algo que também não existe numa democracia excepto nos casos de candidato único.

(1) Mota, M. – Uma pequena janela democrática, Linhas de Elvas de 6-10-2005
(2) ---------- - A derrota do partidismo”, Jornal de Oeiras de 1-11-2005
(3) ---------- - A segunda derrota do partidismo, Jornal de Oeiras de 31-1-2006
(4) ---------- - As duas derrotas do partidismo, Linhas de Elvas de 9-2-2006
(5) ---------- - Partidofobia e Partidocratite, Expresso de 27-10-1979

Publicado no Linhas de Elvas de 24-5-2007

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