17 de março de 2008

“Isto que um dia terá de ser aceite”

Publicado no “Linhas de Elvas” de 24 de Agosto de 2001:

“Isto que um dia terá de ser aceite para todos os níveis de candidaturas a cargos electivos – incluindo as eleições legislativas, e sobretudo em caso de introdução de círculos uninominais - …” escreveu José Queirós no “Público! de 28-6-2001.

Lentamente – demasiado lentamente! – alguns portugueses lá se vão dando conta da monstruosidade do sistema político que nos rege e da Constituição – não plebiscitada! – que o impõe. Muito timidamente – demasiado timidamente! – lá vão fazendo algumas críticas e dando algumas pequenas sugestões sobre o que é necessário mudar para haver em Portugal DEMOCRACIA.

O sistema que no rege é uma partidocracia fanática ou “partidismo”. Neste sistema, os verdadeiros órgãos de poder são os partidos que, além de funcionarem como agências de emprego, se sobrepõem aos órgãos eleitos. Não seria assim se em Portugal houvesse eleições livres e os portugueses pudessem escolher, em liberdade, quem os vai representar no órgão legislativo máximo – a Assembleia da República – e no executivo que dela emana, o governo.

Antes do 25 de Abril os portugueses queixavam-se, com razão, que não podiam escolher em liberdade quem os governava. Havia um sistema que lhes impedia essa escolha, que devia ser livre e não dependente dos desejos de outrem.

Alguns senhores fizeram uma revolução, pretensamente para acabar com tais limitações e dar aos portugueses a liberdade de escolherem aqueles em quem delegam um poder que, em DEMOCRACIA, inteiramente lhes pertence. Mas o que aconteceu foi a implantação duma PARTIDOCRACIA - ou partidismo - um sistema em que alguns detêm o poder, que se expressa muito simplesmente pelo “direito” de elaborarem a “lista” de pessoas em quem os cidadãos têm “licença” de votar!

Depois de tais limitações, já não há inconveniente em dar “liberdade” de voto, ou seja, o acto de meter o papelinho na urna. E dizem-lhes que eles escolheram “em liberdade”! E eles acreditam!

“Isto que um dia terá de ser aceite…” conforme escreveu José Queirós é o que há 25 anos devia estar em vigor se em Portugal tivesse sido implantada a democracia. Tenho-o denunciado em numerosos escritos (dos últimos vejam-se 1, 2, 3 e 4) e, se algo me espanta é como tantos e tão ilustres politólogos se não apercebem da enormidade do sistema político que nos rege. Não sei como não vêem como é pequena a diferença entre o sistema da ditadura com, para efeitos práticos, uma “lista única” e termos agora, para “escolher”, quatro ou cinco “listas”, feitas de forma igualmente ditatorial pelos chefes dos partidos.

Como tenho escrito repetidamente, só teremos DEMOCRACIA quando a eleição dos deputados for feita por círculos uninominais (como José Queirós refere), com total liberdade de candidaturas e em que os partidos se limitem a apoiar os candidatos que entenderem. É o sistema, aliás, que existe em Portugal… mas apenas para a eleição do Presidente da República.

Referências:

1 – Carta aberta ao Dr. Emídio Rangel. Linhas de Elvas de 21-5-99

2 - Votar em liberdade. Correio da Manhã de 8-9-2000

3 - A suspensão do mandato. Correio da Manhã de 23-12-2000

4 - Conceito de democracia. Público de 8-4-2001

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* Investigador Coordenador e Professor Catedrático, jubilado

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