30 de agosto de 2008

Melhorar os professores

Publicado no "Jornal de Sintra" de 23 de Maio de 2008

Avaliar os professores, como outros funcionários - qualquer que seja a função que exercem - é algo natural e conveniente. Julgo que essa era, antigamente, uma das funções dos inspectores do Ministério da Educação, que iam às escolas, assistiam a aulas e diziam de sua justiça. Os inspectores eram antigos professores que ascendiam a esse posto depois de vasta e demonstrada experiência de bom ensino.
São vários os factores que contribuem para o sucesso - ou insucesso - escolar mas creio que, de longe, o mais importante é a qualidade do ensino ministrado pelo professor. Da minha já remota mas ainda viva memória de aluno do liceu ficou bem marcada a diferença de aproveitamento, conseguindo-se os melhores resultados quando a disciplina era dada por um bom professor, não só muito sabedor da matéria mas sendo capaz de a expor de forma clara, compreensível e, por vezes, apaixonante. A matemática tem sido a disciplina mais tratada ultimamente e há boas razões para isso. Se todas as matérias exigem alguma memorização - e treinar a memória é algo também importante - talvez nenhuma exija tanto do raciocínio como a matemática. Por essa razão é também muito importante treinar o raciocínio. Mas um outro factor importante é o encadeado ou continuidade dos diferentes passos da matemática. Se, em determinado ponto, a matéria não ficou sabida ou ficou algo nebulosa, todos os passos seguintes ficam prejudicados e a aprendizagem sofre grandemente. Num exemplo simples, pode dizer-se que não é possível ensinar contas de multiplicar a quem não aprendeu as contas de somar. (Sem máquina de calcular, evidentemente...). Por estas razões, creio que se deve insistir principalmente em melhorar os professores. Sei que algo está a ser feito nesse sentido mas afigura-se-me que muito menos do que seria desejável e que julgo possível.
A avaliação poderá levar a alguma melhoria dos professores, por aumento do esforço próprio. No entanto, a grande melhoria no desempenho dos professores consegue-se através de cursos de actualização(1). Esses cursos, bastante curtos, deverão ter sessões de dois tipos. Um visará a actualização e sistematização dos conhecimentos no sector em que ensinam. Pode ser feita em sessões em grandes auditórios, para muitas pessoas, em lições teóricas proferidas por bons especialistas da matéria. O outro tipo de sessões deve apenas ter um número reduzido de participantes, para trabalhos práticos, quando necessário em laboratórios, e para debate sobre metodologias pedagógicas, com trocas de experiências pessoais e incluindo a disciplina na aula.
Para estes dois tipos de sessões podem dar boa colaboração as sociedades científicas dos sectores envolvidos. A Sociedade Portuguesa de Ciências Naturais organizou, em tempos, uma série desses cursos que, mesmo sem qualquer remuneração ou créditos, encontrou grande apetência da parte dos professores do liceu e sempre cientistas disponíveis para proferir as lições. Alguns foram organizados no período em que exerci o cargo de Vice-Presidente dessa Sociedade e dei também aulas sobre a divisão celular, outros aspectos da citogenética, conservação dos recursos genéticos, microscopia electrónica, etc. Compreende-se o interesse dos professores porque o que aprendiam nesses cursos muito os ajudava, não só na mais fácil preparação das aulas, como na forma como ensinavam, o que dá sempre grande satisfação.
Quando fui eleito Presidente da Sociedade Portuguesa de Genética, logo a Direcção incluiu no seu programa de actividades a realização de tais cursos. Pensando que, com a colaboração do Ministério da Educação, o trabalho poderia ser mais frutuoso, pedi uma audiência ao Ministro. Algum tempo depois o gabinete informou-me que eu seria recebido pela Secretária de Estado e a senhora que me apareceu - e que eu pensei que era a Secretária de Estado - era, afinal, uma assessora, a quem expus o assunto. Achou que tinha todo o interesse e que eu seria posteriormente contactado... o que nunca sucedeu! A Sociedade Portuguesa de Genética ainda conseguiu realizar alguns desses cursos mas em muito menor número do que se tivesse havido uma boa colaboração da parte do Ministério. Julgo que, a nível nacional e em todas as matérias, o que se faz nesse campo é muito escasso. É pena, pois estou perfeitamente convencido de que, realizando todos os anos muitos desses cursos, em todos os sectores do ensino, envolvendo milhares de professores, se conseguiriam progressos espectaculares na melhoria do ensino.

(1) Mota, M. - O problema da matemática. Uma sugestão. Público de 6-9-2002

Sem comentários: