18 de junho de 2011

As listas e os seus cabeças

Publicado no Linhas de Elvas de 2 de Junho de 2011

Se a elaboração das listas em que os pobres eleitores têm "licença" de votar, ditatorialmente, por meia dúzia de pessoas, já é a negação da democracia, a ênfase posta nos "cabeças de lista" é algo que daria muita vontade de rir se não fosse um triste sinal de que, em Portugal, os cidadãos, incluindo os ilustres politólogos, não se dão ao trabalho de raciocinar.
Neste aberrante sistema eleitoral, em que os círculos eleitorais coincidem com os distritos e estes têm um número muito variável de eleitores, alguns deles elegem dezenas de deputados e outros só dois ou três. Nos círculos eleitorais que apenas elegem dois ou três deputados, o cabeça de lista ainda tem importância, pois até pode não ser eleito. Nos círculos que elegem muitos deputados, especialmente nos grandes partidos, que certamente vão eleger mais de um deputado, o cabeça de lista é totalmente irrelevante. Ele está eleito à partida, algo, aliás, que não existe em democracia salvo nos casos de candidato único. De escritos antigos permito-me transcrever:
" O voto em qualquer dessas listas apenas vai influenciar até que nome da lista vão ser eleitos. Isto é, o "cabeça de lista" é perfeitamente irrelevante - pois está eleito à partida - e o voto nessa lista apenas vai conseguir que seja eleito o 5º, o 8º ou o 12º, frequentemente nomes totalmente desconhecidos de quem vota! Apregoar que votem no "cabeça de lista", normalmente escolhido com um nome sonante, como um engodo para caçar patos, é apenas ludibriar o eleitor menos informado."
" Os “cabeças de lista” não se vão defrontar. Com a possível, excepção de algum dos círculos mais pequenos, onde pode haver um ou outro caso em que isso não suceda, todos os cabeças de lista dos dois grandes partidos vão ser eleitos. Nos círculos maiores, não só os cabeças de lista mas uma série de vários dos que se seguem têm, à partida, a eleição garantida (os tais “lugares elegíveis”...), razão por que os políticos que temos criaram e mantêm tão antidemocrático sistema. Um voto nessa lista só vai influenciar a eleição dum qualquer obscuro sujeito, lá para o meio da lista."
" O “Diário de Notícias” de 3-1-2005 trás o título “Duelos escaldantes pelo País” e os retratos duns quantos cabeças de lista que, na realidade, não vão estar em duelo nenhum, pois vão todos ser eleitos.
Luís Filipe Menezes declara no “Correio da Manhã” (30-12-04) que o seu “opositor directo”, em Braga, será António José Seguro. Não será. Ambos vão ser eleitos. Vi, na comunicação social, que Morais Sarmento vai “enfrentar” José Sócrates nas próximas eleições gerais, em que ambos serão “cabeças de lista” por Castelo Branco. Não é verdade. Nenhum vai “enfrentar” o outro, pois ambos vão ser eleitos."
" Só se enfrentariam se os círculos fossem uninominais e apenas o melhor deles, na opinião dos seus eleitores, fosse eleito. E nem mesmo depois de eleitos há qualquer diferença entre os deputados que estavam no topo da lista ou mais abaixo. Como não há qualquer diferença entre os que ganharem por muitos votos ou por poucos. Na Assembleia da República, valem todos o mesmo: um voto. E note-se que estes “candidatos” não são escolhidos como tal pelos eleitores do círculo, mas “nomeados” ditatorialmente pelos chefes dos partidos. Só teremos democracia quando este sistema for drasticamente alterado, nos moldes que já publiquei numa “Proposta de Alterações à Constituição da República Portuguesa” (“INUAF Studia”, Ano 2, Nº 4, Pag. 135-147, 2002)."

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