Publicado no “Linhas de Elvas” em 19-4-2007
“De forma muito negativa. A agricultura em Portugal parece que já desapareceu e não existe, a avaliar pelo discurso politico do governo”.
Na realidade, como se vê, o entrevistado não disse exactamente o que vem em manchete. Apesar de todos os enormes ataques a que tem estado sujeita e das variadas acções de destruição a que a têm submetido os governos das últimas décadas – e de ministros da Agricultura dos quatro maiores partidos, PCP, PS, PSD e CDS – continua a existir agricultura em Portugal e com mais significado do que os nossos economistas insistem em atribuir-lhe, sabe-se lá com que intenções. Basta passear por Portugal para ver que, em todos os sectores da agricultura ainda há alguma actividade significativa, da horticultura à pecuária, da viticultura à floresta e da pomologia à jardinagem. É verdade que não tem a qualidade e a amplitude que podia e devia ter, se em vez das acções de destruição que tem sofrido, tivesse sido desenvolvida como repetidamente e ao longo de várias décadas tenho indicado. E não posso ser acusado de me atribuir ideias luminosas, próprias de seres excepcionais porque os erros cometidos são tão vergonhosamente elementares e o que há a fazer é tão simples nas suas linhas gerais que há o direito de pensar se esses erros são apenas fruto de ignorância ou há algo mais grave. Eu não tenho elementos para decidir.
Um outro comentário é lembrar que foi esse mesmo entrevistado quem, quando membro do governo, muito fez no sentido da destruição da nossa agricultura, especialmente desmantelando os serviços do ministério que são a base e a única alavanca eficiente para desenvolver uma agricultura atrasada e pouco eficiente, e a transformar numa actividade muito mais produtiva e dando muito maior contribuição para a economia nacional. Tratei do assunto em variados escritos e conferências(1) e, até especificamente do caso em questão(2).
Com o actual ministro essas acções de destruição têm atingido níveis inconcebíveis. Num ministério que não faz muito do que devia fazer, o que o actual ministro está a fazer é dispensar pessoal que declara “estar a mais” . O ministério ainda lá tem muita gente competente e esforçada – que provavelmente irá para os que estão “a mais”... – mas vai ficando com pessoal, especialmente de mais alto nível, que bem tem alardeado ignorância e incompetência, alem de muito ajudar à destruição desejada por aqueles que ganham imenso a importar os produtos agrícolas que Portugal tinha obrigação de produzir de melhor qualidade e a mais baixo preço.
O que todos os portugueses deviam lembrar-se é que não são apenas os agricultores a pagar todo este descalabro. Quando vão a um supermercado e ali encontram batatas, cebolas, cenouras, alhos, alfaces, tomates, pimentos, feijão verde, melões, melancias, laranjas, limões, ameixas, pêssegos, nêsperas, maçãs, peras, uvas, morangos, etc. etc. etc. vindos, à vezes de bem distantes terras, deviam pensar o que isso representa na economia portuguesa. Com a destruição da agricultura sofrem o PIB, a inflação, o défice orçamental, o desemprego e a balança comercial. E, como se calcula, esses males repercutem-se na bolsa da grande maioria dos portugueses. Os nossos governantes, de vez em quando, clamam que é preciso exportar mais, pois também temos nesse sector um alto défice. Parece não perceberem que muito mais simples é não ter de importar aqueles produtos que aqui devíamos ser capazes de produzir, como os que acima referi e que bem podíamos exportar em grande quantidade (3).
(1) Mota, M. – Investigação Agronómica e Extensão Agrícola, as bases fundamentais do Desenvolvimento Rural, Vida Rural de Julho de 1999
(2) Mota, M. - “O que é que correu contra as previsões”, Correio da Manhã de 8 de Junho de 1994
(3) Mota, M. - Portugal, a horta da Europa, Linhas de Elvas de 8 de Junho de 2006
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