Publicado no "Linhas de Elvas" de 3-4-2008
Desde o 25 de Abril que uma das palavras mais usadas e apregoadas, não só pelo homem da rua mas também pelos nossos ilustres politólogos, em relação ao sistema político que nos rege, é "democracia". No primeiro artigo desta série dei um exemplo de como os que a apregoam andam bem longe do que ela representa e que eles reclamavam antes do 25 de Abril.
São bem frequentes os exemplos desse desequilíbrio. Recentemente deparei com mais um, bem evidente. O "Jornal de Sintra" de 7-3-2008 publicou uma entrevista com a deputada Ana Gomes. À pergunta se, no caso de ganhar as eleições para líder do PS em Sintra, seria candidata à Câmara Municipal, respondeu: "Não me movo por quaisquer pretensões a ser candidata do PS à Câmara de Sintra - isso será decidido nos órgãos competentes do PS, a seu tempo".
Isto é, algo que, em democracia, é da exclusiva responsabilidade dos cidadãos de Sintra (e o sistema é o mesmo para todos os concelhos), deixa de o ser e os candidatos a Presidente da Câmara Municipal são decididos por alguém que, na maioria dos casos, nem é eleitor no concelho! O sistema é tão ditatorial que já em tempos chamei a atenção para algo que veio a público e que mostrou que, nem dentro do partido se respeita a vontade das bases. Há anos, as bases do PS de Coimbra decidiram que não queriam, para candidato a deputado, o Dr. Manuel Alegre, cronicamente eleito por esse círculo. Não serviu de nada esse desejo, pois o secretário-geral do PS, creio que o Dr. Jorge Sampaio, logo veio dizer que quem decidia era ele, ele indicou o Dr. Manuel Alegre (em "lugar elegível") e... foi eleito.
É claro que as pessoas estão no direito de preferirem um tal sistema. O que não podem é chamar-lhe democracia, pois nesta o poder é dos cidadãos e não dum ou meia dúzia de senhores. Podem chamar-lhe partidocracia, ditadura partidocrática ou partidismo, a palavra que cunhei para estar de acordo com os outros "ismos".
Para a Assembleia da República (as mais importantes eleições) o sistema ditatorial continua em pleno. Para as autarquias, por se abriu uma pequena janela democrática(1), já é possível aos eleitores exercerem os seus direitos e candidatarem-se ou apoiarem os chamados "independentes". (Os outros são, realmente, "dependentes"). Os resultados(2, 3, 4), nos casos onde tal se verificou foram retumbantes e até mostraram como estão erradas as declarações de que "não há democracia sem partidos" ou de que "os candidatos que não sejam apoiados por um partido não têm possibilidades de ganhar".
A única eleição democrática em Portugal é a que elege o Presidente da República. Para termos democracia em Portugal seria necessário que o mesmo modelo fosse usado para todas as eleições e particularmente para a Assembleia da República, o que é simples, como já propus(5). Parece que os portugueses não estão interessados e vivem satisfeitos (ou insatisfeitos...) com esta ditadura.
(1) Mota, Miguel - Uma pequena janela democrática, Linhas de Elvas de 6-10-2005
(2) ------------- A derrota do partidismo, Jornal de Oeiras de 1-11-2005
(3) ------------- A segunda derrota do partidismo, Jornal de Oeiras de 31-1-2006
(4) ------------- As duas derrotas do partidismo, Linhas de Elvas de 9-2-2006
(5) ------------- Proposta de Alterações à Constituição da República Portuguesa, INUAF Studia, Ano 2, Nº 4, Pag. 135-147. 2002
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