6 de novembro de 2008

Socialismo ao contrário

Publicado no "Linhas de Elvas" de 6 de Novembro de 2008

O socialismo nasceu para combater os desequilíbrios económicos e sociais pois em vários países havia ricos (alguns muito ricos) e pobres (alguns muito pobres), os primeiros em pequeno número e os segundos uma verdadeira multidão. Um dos pontos principais do socialismo, pretendendo melhorar a distribuição da riqueza, era a apropriação, pelo estado, dos meios de produção e distribuição. Essa regra era norma no PS, em Portugal, quando esse partido era socialista e de esquerda e andava de braço dado com o PC nas ocupações e nacionalizações, pouco tempo depois do 25 de Abril. Mas esse socialismo e esquerdismo duraram pouco e já não existiam quando, há muitos anos, o então seu chefe Mário Soares declarou que tinha metido o socialismo na gaveta, onde continua aferrolhado a sete chaves. Nessa data, para ser coerente e estar de acordo com a sua declarada praxis, o partido devia ter mudado de nome. A deslocação para a direita continuou progressivamente, algo acentuada com Guterres e enormemente acelerada com Sócrates.Em tempos recentes chegou-se a extremos inacreditáveis, que podemos apelidar de socialismo ao contrário. O problema começou nos Estados Unidos, alastrou à Europa e chegou a Portugal. De repente - o que é estranho - Os Estados Unidos descobriram que uma série de empresas financeiras (responsáveis pelo dinheiro que os seus depositantes lá colocaram) estavam em tal situação aflitiva (apesar dos seus gestores continuarem a auferir valores inconcebíveis...) que o governo federal resolveu intervir com uma quantia fabulosa (dinheiro dos contribuintes...) para que o descalabro não atingisse uma grande parte da população. O quantitativo dessa intervenção, segundo veio nos jornais, era de quatro vezes o PIB de Portugal! Podia considerar-se um caso de socialismo ao contrário. Em vez de nacionalizar empresas rendosas, para que os lucros fossem para as mãos da maioria da população, nacionalizavam-se as que tinham grandes perdas, para a população pagar os prejuízos. Para dourar tão amarga pílula, foi declarado que isso era necessário para evitar graves prejuízos para a população em geral.Este caso sugere-me duas perguntas, que não vi, sequer, formuladas:- como é que o sistema legal não assegura que entidades detentoras de dinheiros de depositantes estejam obrigadas a regras que impeçam que este problema possa ocorrer?- como é que uma tal situação só é detectada quando atingiu tão grave nível e não o foi quando os quantitativos em falta eram, por exemplo, um décimo dos que agora foram detectados?Há quem esteja a considerar a hipótese de isto ser uma fraude monumental, para fazer passar para um pequeno grupo de pessoas muito dinheiro dos contribuintes.Os Estados Unidos, como se sabe, não são um país socialista e todos os seus governos defendem o sistema capitalista embora, como se vê, não tenham sido capazes de assegurar que um tão grave problema nunca pudesse ocorrer.E em Portugal, que se passa, com um governo que se diz socialista e de esquerda? (Quem tenha a noção do que é "socialismo" e "ser de esquerda" sabe que o governo não é uma coisa nem outra). Não comento. Os portugueses têm na frente (escrevo em 2-11-2008) o que está a acontecer.

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